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Você encontrará neste espaço comentários e analises de filmes de todas as épocas. Uma excelente oportunidade para aprender além do cinema.

Patricio Miguel Trujillo Ortega


28 de fevereiro de 2011

Phoebe in Wonderland - A Menina no País das Maravilhas

Phoebe in Wonderland (A Menina no País das Maravilhas). Drama. 2008. Estados Unidos. 96 minutos.

Com Elle Fanning, Felicity Huffman, Bill Pullman, Patricia Clarkson, Campbell Scott, Ian colletti.

Direcão de Daniel Barnz.

Uma pessoa estranha-

O quê é uma pessoa estranha?

Provavelmente responderíamos a pergunta dizendo que é aquela pessoa que não se encaixa no nosso modo de ver o mundo, nos nossos gostos, na nossa forma de nos comportar, partindo da ideia de que o nosso comportamento é o padrão que todas as pessoas deveriam seguir; portanto aquele que não é como “a gente” é uma pessoa estranha.

No entanto essa ideia tem mudado bastante nos últimos anos, embora não o suficiente. Hoje já se sabe que o “estranho”, o “esquisitão”, é muitas vezes uma pessoa que não é assim porque ele simplesmente quer ser desse jeito, mas sim porque ele sofre de algum tipo de transtorno e, quando se trata de uma criança, o problema se complica porque nem sempre os pais aceitam que seu filho tem um problema que merece uma atenção especial, já que todos fazem questão de querer ter seu “filho perfeito”.

A Menina no País das Maravilhas (Phoebe in Wonderland) é um bom filme, sensível, bastante profundo, embora utilize alguns estereótipos na caracterização das personagens e seja tímido para questionar a educação autoritária, que apresenta o drama e sofrimento de uma criança de nove anos de idade que tem a síndrome de Tourette e Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC).

A história-

Phoebe (interpretada de forma magnífica por Elle Fanning) é uma criança de nove anos de idade que mora com seus pais e sua irmã. Ela estuda em uma escola rígida onde as regras, pelo simples fato de serem regras, tem que ser cumpridas e parecem ser mais importantes que as próprias crianças. Por exemplo, no primeiro dia de aula, os professores ensinam aos alunos que tem que obedecer as regras e uma delas é esperar a hora certa para fazer alguma pergunta na sala de aula. Mas, ao serem questionados os professores pelos alunos de quando é a hora certa para fazerem as perguntas, eles não respondem a dúvida dos alunos, pois eles não estão cumprindo as regras.

É nesse ambiente contraditório que Phoebe, uma menina que não se parece em nada com seus colegas, estuda e, para ela, esse é o pior lugar que pode existir. Mas, a nova professora de teatro convida aos alunos, de uma maneira muito original, para participarem da audição para escolher aos estudantes que atuarão na peça Alice no país das maravilhas. Phoebe duvida muito em participar ou não, até o momento em que ela vê a própria Alice correndo nos corredores da escola, onde está escondendo-se e brincando com ela.
Phoebe e seus pais
Esse é o ponto de partida do filme para conhecer quem é realmente Phoebe: uma criança que sofre com os diversos comportamentos característicos das síndromes que ela tem.

As personagens -

Phoebe é uma criança que questiona tudo. Para ela não é fácil aceitar as regras, por isso, como falamos no começo, ela pergunta quando é a hora certa de fazer perguntas. Além disso, como consequência dos seus problemas, fica aprisionada em um comportamento de ações repetitivas: fica dizendo uma mesma frase muitas vezes; chega a se machucar os joelhos por estar se arrastrando durante muito tempo sem um motivo aparente; confunde a realidade com a fantasia (o que a levará varias vezes a viver situações de extremo perigo); diz coisas sem sentido e agride as pessoas com as palavras, ainda que ela não queira fazer isso.

Os pais (Peter e Hillary) são personagens estereotipados – isso enfraquece até certo ponto o filme, embora entendamos que esses estereótipos ajudem a mostrar melhor o entorno conflitivo de uma criança que tem diversas síndromes, pois isso faz que o público possa se identificar mais; no entanto, perde-se a oportunidade de mostrar o outro lado da realidade, pois os pais nem sempre são desse jeito.

Hillary, a mãe, em algumas situações é muito mais conflitiva que a própria filha. Quando é chamada à escola porque Phoebe sofre um acidente, ela se descontrola frente à professora de teatro. Antes de ir embora, ela sai de repente do carro decidida a fazer alguma coisa para resolver o problema da filha e joga na cara da professora um discurso que não faz sentido. É uma reclamação de quem se sente culpável, pois ela se acha responsável pelos problemas da sua filha. O conflito de Hillary com ela mesma é tão grande que até as situações mais simples as transforma em comportamentos descontrolados, como a cena na qual ela varre com a vassoura o jardim de sua casa de uma maneira quase histérica.

A verdade é que Hillary não sabe como administrar o tempo com a sua família, em especial com Phoebe, o que influencia até no seu trabalho (ela está escrevendo sua dissertação que, por coincidência, é sobre a história de Alice no país das maravilhas). Ela confessa a seu esposo que está passando por um momento de estancamento criativo.

Porém, Hillary é a primeira a perceber que sua filha, a cada dia, está pior. Mas isso não é suficiente, pois acredita que ela, como mãe, tem a culpa porque não tem tempo para passar com as filhas. Esse sentimento de “coitadinha” que ela desenvolve, só ajuda a piorar a situação de Phoebe.

O pai, Peter, no melhor estilo estereotipado da maioria dos filmes dos Estados Unidos (não sei na vida real eles são desse jeito mesmo), não sabe como conversar com sua filha. Tem uma dificuldade muito grande em se relacionar com Phoebe. Tenta dialogar e até faz um esforço para não repetir os erros que o seu pai teve com ele; mas tudo sem sucesso. Um exemplo dessa dificuldade comunicativa é a cena na qual Phoebe e sua irmã, brincando, pedem aos pais um “irmão’”. Peter diz a Phoebe que a mãe (Hillary) não aguentaria jamais outro filho como ela (como a Phoebe).

Essas palavras de Peter mostram a uma pessoa que não tem empatia com a filha porque vive pensando só nele. Ele ainda não superou os traumas do seu passado e, embora tenha boas intenções, não faz o necessário para estabelecer uma ponte de comunicação com as suas filhas.

Olivia, a irmã de Phoebe, é uma menina inteligente e forte, mas se sente sozinha já que ela não recebe a mesma atenção que a irmã. Além disso, ela reclama de ter que fazer tudo o que a irmã quer e resolver os problemas de Phoebe. É uma menina que sente “angústia”, nas próprias palavras dela.

Jamie é uma personagem interessante. Ele é um colega de Phoebe que deseja representar o papel da Rainha de Copas, embora esse seja um papel feminino. Os seus colegas zombam dele quando consegue o papel, mas ele confia nele e, aparentemente, não se deixa abalar pelas provocações de seus companheiros.

Jamie tem um comportamento diferente dos demais e é verdade que serve como um imã em Phoebe, pois eles não só que são bons amigos, mas no final assumem a liderança do grupo ao ficarem sem a professora de teatro. No entanto, tivemos a impressão de que com esse personagem houve uma tentativa de apresentar “outro tipo de comportamento não convencional” para fazer um contraste com as normas rígidas da escola que não favorece a comunicação das pessoas. Por isso, a personagem é superficial e poderia ter sido aproveitada de melhor forma.

Miss Dodger, a professora de teatro, cumpre um papel importante nos problemas de Phoebe. É com ela, e durante os ensaios, que a menina passa a se sentir bem e consegue manter-se concentrada, pois ela passa a “viver no país das maravilhas”, que é o único lugar onde não sente a pressão dos “outros”, de “esse mundo” com o qual, devido a seu transtorno, não consegue se relacionar. Miss Dodger diz a Phoebe: “em certo momento da sua vida você vai abrir os olhos e ver quem realmente você é. Especialmente por tudo que a tornou tão diferente de todos os horrivelmente Normais”.

O conflito-

O ponto central do filme está na decisão que deve tomar Phoebe de se inscrever ou não na peça de teatro que, em um primeiro momento, parece ser o melhor para ela. No entanto, ela tem problemas de socialização com as outras crianças, como acontece quando ela se nega a brincar de “pega- pega”, pois ela se sente ameaçada, o que provoca um comportamento agressivo, como o fato de cuspir em uma colega. Ao mesmo tempo, desenvolve alguns rituais ‘estranhos’, como contar quadrinhos na calçada, girar três vezes, subir as escadas pulando até cansar. Também não deixa de repetir as falas de outras pessoas e, em geral, debocha dos outros e faz uso constante de palavrões.

Frente a este problema, os pais de Phoebe tentam fazer algo, principalmente Hillary, que quer ter mais tempo para estar com as duas filhas, já que ela tem dificuldade em aceitar que a sua filha tem a síndrome de Tourette, motivo pelo qual se recusas a dar remédios a sua filha. Além de pensar que ela não é uma boa mãe, passa a julgar aos médicos, achando que eles rotulam as crianças.


Em síntese, A Menina no País das Maravilhas é um ótimo filme, principalmente pela atuação de Elle Fanning. Apresenta uma temática difícil e delicada que afeta a muitas pessoas, mas no fundo não se atreve a questionar diretamente essa educação manipuladora e autoritária que castra as crianças, como faz constantemente o diretor da escola com a sua indiferença aos problemas que afetam a Phoebe. No resto, o filme é simples, com uma história linear. O ponto forte do filme é o conteúdo da história e a interpretação dos protagonistas.

Texto original de Patricio M. Trujillo O.

Proibida a reprodução total o parcial do texto sem a devida autorização do autor.

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