O filme que assistimos...

Você encontrará neste espaço comentários e analises de filmes de todas as épocas. Uma excelente oportunidade para aprender além do cinema.

Patricio Miguel Trujillo Ortega


19 de julho de 2016

The Decoy Bride (A noiva isca)



The Decoy Bride (A noiva isca). 2011. Reino Unido. Comédia. 89 minutos.

Com Kelly MacDonald, David Tennant, Alice Eve.

Direção de Sheree Folkson

Mais uma comédia romântica?

The Decoy Bride (A noiva isca) é uma comédia romântica e a primeira impressão que temos desse filme é que parece ser mais uma das tantas comédias românticas que chegam ao mercado, embora seu humor britânico seja distante do hollywoodiano; mas é uma impressão imprecisa.

A segunda impressão, então, é que o filme não consegue fugir totalmente dos clichês e de certos estereótipos que caracterizam as comédias românticas previsíveis quase na sua totalidade, ainda que essa nos surpreenda com alguns elementos culturais com os quais não estamos acostumados. E essa impressão, como a anterior, também é imprecisa.
The Decoy Bride
A terceira impressão é que, apesar da soma inevitável da primeira com a segunda impressão, The Decoy Bride (A noiva isca) é um filme muito agradável de assistir graças a sua história original, a suas personagens únicas com um humor singular, às vezes sutil e outras, direto. Além disso, a paisagem exótica com seus nativos, seus costumes e a possibilidade de descobrir novas perspectivas de vida.
Os habitantes da Ilha Hegg nas Ilhas Hébridas

Hegg, a ilha mais feia das Ilhas Hébridas, ao norte da Escócia.

Katie Nic Aoidh, interpretada por Kelly MacDonald, volta ao seu lar desiludida do amor. Ao se aproximar a sua terra natal, ela joga ao mar uma aliança que simboliza a sua última esperança frustrada de se casar.
Katie retorno a casa de sua mãe
Depois de ter ficado algum tempo longe de seu lar, ela volta para a ilha Hegg, uma das ilhas mais remotas das Ilhas Hébridas, ao norte da Escócia. Segunda ela, a ilha mais feia da região onde não moram mais que setenta e cinco pessoas e todos os menores de cinquenta anos – com os quais ela poderia se casar – já estão casados. Katie volta resignada com a sua situação e tenta se acostumar ao ritmo pacato da região no hotel de sua mãe.

A maior tristeza no momento do retorno de Katie é que volta justo a tempo de assistir ao casamento do último solteiro da ilha com quem ela poderia ter se casado: seu ex-namorado. Tanto é que, assim que chega ao casamento, uma das convidadas, uma mulher velha, lhe diz: “Você chegou demasiado tarde para se casar com ele”. E praticamente a noiva fala no ouvido de Katie a mesma frase.
O Ex e Katie no casamento dele
Ao mesmo tempo, longe da ilha Hegg, no meio da fama e de ter a vida sempre exposta pela mídia, Lara Tyler, uma atriz muito famosa, não consegue casar-se com James Niel porque os paparazzi estragam o desejo da atriz, que é ter um casamento privado e íntimo. Os noivos tentam enganar aos paparazzi utilizando noivas falsas como iscas para poder ter a sua celebração como eles querem, mas há um paparazzi, no meio de todos os outros, que sabe como arruinar os planos dos noivos, e não se importa com os sentimentos deles. “Você está arruinando a minha vida”, diz Lara ao fotógrafo. “Já arruinei a vida de outros e a sua vida não tem nada de especial”, responde o paparazzi.
O paparazzi: "... a sua vida não tem nada de especial"
A equipe de assessores dos noivos, liderada por Steve, encontra uma solução para realizar o casamento no maior dos sigilos: aluga um castelo abandonado na Ilha Hegg para realizar a cerimônia e, para evitar que os habitantes da ilha atrapalhem os planos, assim como a mídia, anunciam que o evento no castelo é uma conferência de vendedores.
O castelo
Só que nem Lara, nem James e nem a sua equipe de assessores poderiam se imaginar que a chegada deles à Ilha Hegg provocaria tanta comoção, pois os habitantes, ao saberem que o castelo foi alugado, aproveitam a oportunidade para poder ganhar um dinheiro extra com o evento, como já tinha acontecido uma vez há muito tempo.

As personagens.-

Cinco são as personagens que merecem um destaque especial: Katie, Lara, James, Steve e a mãe de Katie.

Katie tem trinta e dois anos de idade e volta a sua terra natal porque acredita que não há outra opção para ela na vida. Seu sonho de se casar terminou e ela está disposta a viver junto com a sua mãe, embora no fundo ainda deseja encontrar algo a mais na sua vida. Ela pensa que esse “algo a mais” é o “amor” ou, em outras palavras, “o casamento”, sem perceber que a sua vida pode ir também por outros caminhos que a deixem satisfeita.
Katie
Para entender bem essa preocupação com a necessidade de “se casar”, há que compreender que os habitantes moram em uma ilha muito remota e, apesar de estar em contato com o mundo por meio da tecnologia, seus costumes e suas aspirações são diferentes de outros lugares. É como se esse fosse o único destino das suas vidas. Quem não foi embora, é porque ou não teve a oportunidade de fazê-lo ou se conformou com o jeito de ser dos habitantes da ilha, quem são felizes vivendo em seu próprio mundo.

Ao chegar à ilha, Katie interage com a população local e tenta aceitar com humor a sua situação de “solteira”, o que é comentado pela vizinhança; mas, no fundo ela não está satisfeita com estar solteira e compartilha as suas frustrações com a sua mãe, quem lhe diz: “Há alguém para você em algum lugar”. Mas, Katie tem a resposta que demonstra o que ela sente de verdade: “Eu sou com a kriptonita para os homens. Uma kriptonita com celulites”.
Katie e James
A vida de Katie nunca foi emocionante e nunca conseguiu realizar seus sonhos. Talvez ela tenha pouca autoestima e tomou as decisões erradas. Mas ela vê essa situação com humor. Quando conversa sobre seu antigo trabalho, antes de voltar para à ilha, alguém lhe diz: “Pensei que você tinha dito que aqui (na ilha) nunca acontecia nada”. Katie responde: “Que não aconteça nada é o mais emocionante da minha vida”.

Katie volta trabalhar na loja de Laird, a pessoa mais importante da ilha, quem lhe propõe um trabalho especial: que ela escreva uma guia turística sobre a ilha Hegg. E essa proposta é o pontapé inicial para que ela possa encontrar outro sentido a sua vida.
The Decoy Bride
Lara Tyler, segundo seu noivo, é uma mulher perfeita e segundo uma pesquisa feita com 10.000 homens, 9.800 queriam casar-se com ela. Ela é uma atriz americana muito famosa e seu desejo é que a imprensa não se meta em sua vida. Quer uma vida de paz e tranquilidade e seu sonho é ter um casamento íntimo e privado com seu noivo. Tudo o que sabemos dela, é pelo que contam as outras pessoas que estão ao seu lado. No relacionamento que ela tem com James Niel, ela é quem comanda as decisões, os gostos, e tudo feito de uma forma sutil.
Lara Tyler
James Niel, o noivo, é um escritor que escreveu só um livro: A esposa do ornitólogo e ainda espera a “inspiração” para poder escrever seu segundo livro, pois Lara pensa que ele será o grande escritor do século XXI. O problema é que se descobre que James, como escritor, é uma fraude, pois seu livro, que na teoria foi inspirado na ilha Hegg, não tem nada a ver com essa ilha, o que significa que ele escreveu uma história de um lugar do qual não sabe nada. Durante o filme, há vários momentos nos quais o humor gira em torno deste assunto, como quando Katie, sem saber que está conversando com o James, fala que eles (os habitantes da ilha) achavam que esse livro melhoraria depois da página 600 e se oferece para ajudar a levar o livro, de tão pesado que ele é. De todas formas, James é uma pessoa que ainda não descobriu a sua própria identidade, pois atua sob as ideias de Lara.

James e Katie
Steve, o assessor do casal, é talvez a personagem mais engraçada do filme, pois suas palavras são sarcásticas, irónicas e põem em evidência o excesso do “ego” de Lara y James. Em outras palavras, Steve é a “voz” que mostra a atitude exagerada em torno dos “famosos”.
Steve
A mãe de Katie tem uma função muito interessante no filme, pois ele é o oposto da sua filha e dos demais habitantes da ilha. Ela está doente, sabe que vai morrer em breve e sempre desejou sair da ilha, conhecer o mundo e ser jogada em um vulcão. No entanto, as circunstâncias da vida não lhe permitiram realizar esse sonho; mas, com o retorno de sua filha e a chegada de Lara e James, uma nova perspectiva se apresenta frente a ela.

A noiva isca e o humor.-

Como já foi dito no começo do texto, A noiva isca (The Decoy Bride) é uma comédia romântica que não foge totalmente do humor estereotipado desse tipo de filmes; porém, uma boa dose de seu humor parte das características da população local e outra, da própria confusão criada com a chegada de Katie, Lara e James.
A noiva isca
Quando Katie recebe a proposta que lhe faz Laird de fazer uma guia turística da ilha Hegg, ela percorre a ilha e descreve as caraterísticas geográficas e da sua população. Por exemplo, ficamos sabendo que eles consideram a ilha tão insignificante, que nem sequer os Vikings prestaram-lhe atenção quando invadiram a região.  O valor da diária do hotel da mãe de Katie é de 16 libras esterlinas; mas, quando ficam sabendo do evento dos vendedores, a mãe só troca os números e o valor passa a ser de 61 libras e pede a sua filha que se alguém perguntasse sobre o hotel, que dissesse que tem duas estrelas, mas que estão perdidas.
Katie, o hotel e a Ilha Hegg
Percebe-se também a rivalidade dos habitantes das Ilhas Hébridas com os das Ilhas Órcades ou Órcadas (que ficam ao sul das Hébridas) com uma só frase dita em todo filme. Quando chegam os visitantes, uma mulher fala para Katie: “nada de se jogar nos braços dos visitantes; não queremos que pensem que estão nas Órcades”.

A chegada dos paparazzi à ilha provoca a confusão que é o tema central do filme. Lara se esconde para não ser descoberta pelos fotógrafos e, como ninguém sabe onde ela está, Steve tem que improvisar para desorientar aos fotógrafos: ele contrata Katie, por 5.000 libras esterlinas, como “noiva isca” para fingir que é Lara. “Não me pareço em nada com Lara”, diz Katie. “Ela (Lara) tampouco se parece com ela até que elas (as esteticistas) a arrumam”.
O casamento
Como Lara é americana, Katie tem que improvisar o sotaque americano. Um humor linguístico simples, mas efetivo.

Quando Lara e James chegam à ilha, James fala: “Não tenho nem ideia de onde etamos, mas isto é perfeito”. Só depois é que ele descobre que está na Ilha Hegg, na qual “ele” se inspirou para escrever seu livro, o que provoca a ironia constante de Steve.

Cenas claves.-

Poderíamos citar como uma cena clave o momento em que Katie quase se afoga, pois quando isso acontece ela acha que esse foi o momento mais emocionante de sua vida. Portanto, é uma forma de conhecer até que ponto a vida dela é entediante; mas a cena que muda o destino da história é a mais romântica que há no filme e nela não participam nem Katie, nem Lara.

James está perdido na ilha e ele está usando uma roupa que era do pai de Katie. A roupa é esquisita e o pai da Katie usava-a quando tocava a gaita escocesa. James vê uma casa e se aproxima para pedir ajuda. Logo descobre que o casal de velhos que ali moram é surdo e quando eles o vêm com a roupa do gaiteiro, se emocionam, pedem para ele autografar o disco do pai de Katie e para tocar a gaita. Imediatamente, o casal começa a dançar como se estivessem ouvindo a música, e James percebe a paixão que une aos dois velhos e mexe definitivamente na forma em que ele se encara a se mesmo e aos outros. É uma cena delicada e belíssima, construída de um jeito simples, mas eficaz.

Palavras finais.-

A Noiva Isca é uma aventura que às vezes se transforma em uma desventura, mas tudo acabada dando certo. É um filme dinâmico e como pano de fundo tem uma paisagem espetacular, que se destaca como se fosse mais uma personagem, com identidade própria, graças ao bom trabalho fotográfico e ao uso dos mais variados planos fotográficos que ajudam a destacar à Ilha Hegg.

E para terminar, podemos resumir o filme nas palavras desafiadoras da mãe da Katie para sua filha: “Uma vida gasta em erros é muito melhor que uma sem ter feito nada”.

The Decoy Bride (A noiva isca) é um filme que vale a pena de ver, ainda para aqueles que não gostam de comédias românticas.
The Decoy Bride
Texto original de Patricio M. Trujillo O.

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