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Patricio Miguel Trujillo Ortega


29 de janeiro de 2012

The Whistleblower - A Informante

The Whistleblower (A Informante), 2010, Drama, 111 minutos. Alemanha – Canada.

Com: Rachel Weisz, David Strathairn, Monica Bellucci, Vanessa Redgrave

Direção: Larysa Kondracki.

A Informante é um filme que choca por seu tema, porque coloca em xeque a credibilidade de instituições que, teoricamente, ainda existem para ajudar a humanidade.

Até que ponto as instituições mundialmente conhecidas são realmente o que elas dizem ser?

Até que ponto estas instituições se preocupam mesmo pela dignidade das pessoas ou não passam de uma peça da máquina do poder que visa o domínio e o lucro passando por cima do sofrimento humano?

Quando a guerra dos anos 1990 destruiu a Iugoslávia, as tropas da ONU, formadas por soldados e policias de muitos países, foram como uma força de paz para tentar reconstruir e organizar um país dividido e, portanto, ajudar os sobreviventes da carnificina a construírem a sua nação.

Mas, esta força “humanitária-militar-econômica” fez isso mesmo de uma forma desinteressada?
Kathy Bolkovac
A Informante é um filme que choca porque narra uma parte negra dessa história na que os protagonistas são justamente os que teriam que ter ajudado a população. É a história de um episódio que, ainda que foi denunciado na época, não teve a punição que deveria ter tido, talvez porque o poder econômico é mais importante que a dignidade humana?

A Informante é um filme que nos grita: não devemos esquecer a hipocrisia das grandes instituições, como a ONU e de algumas das empresas terceirizadas por este organismo que preferiram ignorar que alguns dos seus funcionários trabalhavam e se beneficiavam com a prostituição e a escravidão de mulheres brancas que saiam dos países da Europa Oriental, devastada moral e economicamente com o fim do sonho soviético, e que caíram na mão de homens inescrupulosos que tiveram o apóio - cumplicidade - silenciosa, não oficial, destas instituições.
Kathy Bolkovac: uma policial dedicada ao seu trabalho
A Informante é baseada na história da policial Kathy Bolkovac, interpretada por Rachel Weisz. Ela é uma mulher que vive em Nebraska (USA) e é dedicada totalmente a seu trabalho. Teve dois matrimônios fracassados e no último perdeu a guarda da sua filha. 

Kathy e sua filha
Porém, como é uma boa policial, acaba aceitando a sugestão de sue chefe e se inscreve para participar das tropas da ONU que estão em Bósnia-Herzegovina. A sua motivação é o salário de 100.000 dólares: dinheiro que ela acredita será de muita utilidade para poder estar, no futuro, perto da sua filha, mais ainda porque seu ex-marido foi morar em outro estado.

Kathy Bolkovac, além de ser uma policial dedicada ao serviço, é competente e, principalmente, honesta. Ela acredita no trabalho que estão fazendo na antiga Iugoslávia e fica chocada com a apatia, o racismo, o desprezo que vê ao seu redor; mas, como ela é eficiente, logo é promovida e seu trabalho é tentar salvar as mulheres jovens que saíram de seus paises com as falsas promessas de uma vida melhor e que trabalham como prostitutas em prostíbulos disfarçados de bares, com a cumplicidade da polícia local e de muitos soldados da força de paz da ONU, que são os principais clientes e exploradores destas jovens que vivem na imundície, amontoadas em quartos, sem poder saírem para nenhum lugar, iludidas, porque acreditam que ainda poderão ser livres quando terminarem de pagar as “dívidas” que elas têm com os donos dos bares que as violentam e as assassinam se não fizerem as coisas como eles querem.
Kathy Bolkovac tenta encontrar uma forma de ajudar as jovens garotas
Kathy Bolkovac descobre esta situação e se esforça desesperadamente em salvar estas jovens; mas, a burocracia e apatia de altos funcionários, além da corrupção dos soldados de diferentes nacionalidades que ganham com o negócio, não permitem que seu trabalho tenha sucesso. Muitos soldados que estão no país para ajudar na sua organização mostram que o mais importante para eles é a vida deles. Mais nada!

A Informante prende ao espectador com seu roteiro que está bem elaborado e que acontece em quatro lugares: Ucrânia, Nebrasca, Bósnia e Londres.

Nos primeiros minutos, o filme nos mostra uma das garotas que posteriormente a policial Bolkovac tentará desesperadamente salvar a sua vida. Raya e uma amiga dela vivem na Ucrânia e estão em uma festa. Raya é convidada por sua amiga para ter uma aventura - não é dita qual é-, mas ela, temerosa, não aceita. O problema é que ao chegar a sua casa, a sua mãe reage verbalmente com violência, até o ponto que Raya vai embora e, pelo que se entende, nunca mais voltará. Esta cena é rápida e logo vemos a Raya tirando uma foto para seu passaporte.
Raya e seu destino final
Imediatamente conhecemos a policial Kathy Bolkovac em Nebraska, Estados Unidos. Rapidamente sabemos da sua tentativa falida de ser transferida, da sua situação com seu ex-esposo e com a sua filha e o convite para integrar as forças da paz da ONU. Os diálogos são rápidos; não há muitos detalhes da vida pessoal da policial e logo em seguida ela já está na Bósnia fazendo seu trabalho.

A maior parte do filme transcorre na Bósnia. As cenas são rápidas e vai apresentando o esforço que a policial faz para solucionar os problemas do país. Depois, quando descobre o negócio da prostituição-escravidão, Kathy Bolkovac tenta ajudar as jovens, protegendo-as, mas se encontra com uma burocracia que só dificulta seu trabalho e coloca em risco a vida das mulheres. Os diálogos são diretos e não perde tempo com diálogos cansativos. O filme é ágil; a seqüência de um lugar para outro é muito rápida. Mas, apesar de ser um filme rápido, as cenas de ação são limitadas porque parece que o seu objetivo é aprofundar na problemática e não no sensacionalismo e superficialismo que o tema poderia propor.

As cenas mais fortes do filme são as que mostram a situação das jovens mulheres que estão presas em quartos onde não tem nenhuma condição digna de vida. A violência com que são tratadas pelos seus carcerários. Parte da história é contada através de fotos. Quando a policial entra num destes bares, encontra muitas fotos coladas em uma parede. Estas fotos contam a história das jovens e seus sofrimentos. Em algumas delas se vê soldados da força da paz da ONU abusando sexualmente das garotas, que chegam incluso a serem “vendidas” por uma noite por uma boa oferta. Há uma cena na que o “dono” das garotas disse para um homem que vai sair com três garotas que só devolverá a “garantia” se as garotas voltarem vivas.
Uma das tantas iludidas, enganadas... e sem esperança
A violência física contra estas moças aparece no filme, mas de uma forma tímida. Não há interesse em mostrar gratuitamente o que acontece com elas. A cena mais forte neste sentido é quando Raya, a jovem do começo do filme, logo depois de ter sido ajudada pela policial, é capturada novamente numa emboscada enquanto tentavam salvar a garota. Como uma forma de puni-la e que sirva de exemplo para qualquer outra das moças que pense em fazer o mesmo, ela é deitada de boca para baixo e violentada com um cano. A cena mostra os gritos da menina, seu rosto de sofrimento e, numa fração de segundo, uma das pontas do cano, manchada de sangue.

Outra cena impressionante é quando Kathy Bolkovac chora de sofrimento por Raya e pela impossibilidade de ajudar a garota. O choro não é para comover o público: é o choro da impotência, de saber que uma palavra pode pôde fazer a diferença entre viver ou morrer.
Viver ou morrer
A jovem Raya pode sair da sua “prisão”, mas para isso ela tem que dizer que quer ir embora; do contrário, ninguém pode tirá-la de onde está. (o absurdo da burocracia onde os “papéis” e certas fórmulas são mais importantes que a dignidade humana).

O problema é que Raya tem medo, assim como todas as outras jovens, pois elas reconhecem nos policias e nos soldados que estão atrás de Kathy Bolkovac, teoricamente para ajudá-la, os homens que abusam delas. Kathy se desespera e pede para que ela não mire aos soldados e aceite o que ela está oferecendo. Mas o medo é muito mais forte e ela será punida como escarmento para que nenhuma outra mulher tente escapar.

Os choros da mãe, na Ucrânia, não vão trazer a sua filha de volta. E mais ainda quando descobre que o marido da sua irmã ajudou na participação desse tráfico de gente.
Kathy Bolkovac expulsa da força da ONU: punição por querer ajudar
No final, Kathy terá que agir escondida para tentar denunciar na Inglaterra o que acontece na Bósnia, já que as autoridades locais e internacionais decidiram que todas as investigações dela teriam que ser canceladas. Bolkovac não aceita a decisão dos seus superiores e decide continuar fazendo seu trabalho, até que é demitida por tentar salvar as garotas e que sejam punidos os culpados.

Então ela toma a decisão de levar os documentos para Inglaterra e apresentá-los na televisão. Tem a esperança de que se faça justiça. As cenas da televisão são rápidas. Mostra partes das entrevistas que fizeram tanto com ela quanto com os seus chefes da organização. Esta cena rápida na televisão de não entrar em detalhes tem sentido pelo que é dito no final do filme, quando sabemos que os soldados e funcionários que participaram do esquema, voltaram para seus respectivos países, onde nenhum deles foi detido.
Até que ponto as instituições são o que elas dizem ser?
Além disso, o filme denuncia que a empresa terceirizada pela ONU para resolver os problemas na Bósnia e que sabia do que acontecia com as jovens escravizadas e prostituídas por alguns dos seus próprios funcionários –pois os soldados eram pagos por esta instituição- continuou trabalhando para o governo dos Estados Unidos e esteve presente no Afeganistão. Também chegamos a conhecer que a policial Kathy Bolkovac nunca mais conseguiu um trabalho a nível internacional – a punição, com certeza, pelo que ela fez.

A Informante é um filme forte, chocante, mas é sensível e deve ser visto. Participou no 22º edição do Festival de Cinema do Human Rights Watch e a sua estréia foi no Festival Internacional de Cine de Toronto de 2010.

Últimas palavras para falar da excelente atuação de Rachel Weisz, sem esquecer-se da pouca, mas ótima presença de Vanessas Redgrave, que fazem a diferencia em qualquer filme.

Texto original de Patricio Miguel Trujillo Ortega.

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