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Patricio Miguel Trujillo Ortega


19 de março de 2013

Les femmes du 6º ème étage - As mulheres do 6º andar



Les femmes du 6º ème étage – As mulheres do 6º andar. Comédia. 106 minutos. 2010. França.

Com: Fabrice Luchini, Sandrine Kiberlain, Natalia Verbeke, Carmen Maura.

Direção: Philippe Le Guay.

As mulheres do 6º andar é um filme “delicioso” de assistir. É uma comédia francesa bucólica que acontece nos anos sessenta em Paris. Com uma estrutura narrativa simples e personagens únicos, cativa com a sua história profunda de amor que vai além do “amor” passional. O filme rompe as fronteiras, une as pessoas sob um conceito intenso de solidariedade, ataca os preconceitos e estereótipos cujo resultado é uma história que nos deixa uma mensagem otimista da vida com um sorriso de alegria verdadeira pois se torna possível atingir os sonhos.

Nos anos sessenta, na França de Gaulle e na ditatura repressora da Espanha de Franco, muitas mulheres espanholas do interior iam para Paris para trabalhar como empregadas domésticas. Como elas trabalham mais de doze horas por dia e não reclamam de ter que trabalhar no domingo, conquanto possam assistir à missa, as pessoas da classe média preferem contratá-las às empregadas francesas.

Este é o ambiente de As mulheres do 6º andar, um filme onde pessoas de condições sociais diferentes vivem separadas, mas algumas encontram um sentido profundo na sua vida quando abrem os olhos e, ao deixarem cair o véu que as separa, descobrem nelas seu próprio sentido da vida.
Jean-Luis e Suzanne
Ainda que o filme comece apresentando questões sociais profundas como resultado da migração das mulheres espanholas, e que estas questões estejam presentes ao longo do filme todo, As mulheres do 6º andar é uma história de amor, previsível em alguns aspectos, mas rica na maneira como as pessoas se conhecem e se comprometem entre elas.

A história pode se resumir em poucas linhas, mas há que se conhecer as personagens ricamente criadas.

Jean-Luis Joubert é um homem maduro, casado e tem dois filhos. Ele trabalha na bolsa de valores e é uma pessoa metódica e sistemática. Gosta de fazer sempre as mesmas coisas e evita, de qualquer jeito, o confronto com as pessoas. Vive no prédio que sempre foi da sua família e tudo tem que ser como ele se acostumou que seja. Por exemplo, no café da manhã ele tem que comer um ovo cozido que deve ser preparado em exatos três minutos e meio, caso contrário seu dia começa de uma forma errada. Ele fala para a nova empregada que tem que se despedir dizendo “Até a noite, senhor”, não porque ela queira, mas porque “ é assim”.
Suzanne e suas amigas
Suzanne é a esposa de Jean-Luis. Ela gosta que a empregada a chame de “madame”. Como seu marido, é uma mulher sistemática que não faz nenhuma tarefa doméstica. Ela vive muito ocupada com os compromissos sociais que tem com outras mulheres da sua mesma classe social. Como seu marido, ela não é uma pessoa expressiva e a vida dela é um conjunto de hábitos rotineiros que afeta a vida do casal, embora nenhum dois perceba isso de tanto que estão acostumados a se comportar desse jeito. Um exemplo disso acontece no meio do filme quando ela reprende seu marido de não perguntar nada sobre o dia dela. Ele responde, mecanicamente, citando uma por uma todas as atividades que ela faz nas quartas-feiras.

María e seu primeiro dia em Paris
O casal tem dois filhos que aparecem somente duas vezes. São dois adolescentes inexpressivos, mimados, frios e são um reflexo do comportamento de seus pais. Apesar disso, questionam o “mundo” de seus pais, embora estejam atados a esse “mundo” Um exemplo disso acontece em um fim de semana quando eles vão para casa, já que eles estudam em um internato. Ao conhecerem a nova empregada, tentam ser autoritários e intimidá-la, mas na hora do almoço com os pais, lançam as frases “subversivas ao sistema” que escutam de seus professores na escola. A presença destas duas crianças, ainda que seja de pouquíssimos minutos, tem sentido no final da história, e logo falaremos disso.
As mulheres do 6º andar
María é uma jovem espanhola que acaba de chegar a Paris para trabalhar como empregada. Ela se hospeda junto com a sua tia Concepción no sexto andar do prédio de Jean-Luis. Esse é o andar onde mora um grupo de espanholas, Dolores, Carmen, Teresa que trabalham em outros departamentos do prédio. O sexto andar só existe para elas. Os patrões não sabem nada do que acontece aí; quer dizer, a separação social está marcada fisicamente e bem delimitada. Por exemplo, elas devem usar um banheiro entupido porque não há ninguém que possa ajudá-las.

As espanholas formam um grupo que se assemelha a uma família. Elas compartilham seus problemas, suas alegrias e o mesmo espaço; riem entre elas e são solidárias em todas as situações que precisam ser, apesar de haver diferenças ideológicas e de comportamento entre elas, como é o caso de Carmen, antifranquista e esquerdista, ou de Teresa que está a procura, desesperadamente, de um homem que a sustente.
Jean-Luis explica a maneira de fazer os ovos
As mulheres do 6º andar entram de cheio na vida de Jourbert quando Germaine, a empregada que trabalha para ele e a sua esposa há mais de 20 anos, vai embora depois de uma briga com a “madame”. Germaine defende a memória da mãe de Jean-Luis que não tinha um bom relacionamento com Suzanne. Por isso, ele é obrigado a contratar uma nova empregada e é aí que entra María.

Depois de passar “a prova” ela é contratada por 250 francos, que é o salário que Jean-Luis oferece, embora decida lhe pagar 400 francos, como ela pediu, mas sem que sua esposa saiba. É mais um exemplo de como ele não gosta do confronto.

Desde o primeiro momento, percebe-se que Jean-Luis gosta de María; mas ele controla suas emoções e se comporta profissionalmente. Em momento algum ele abandona a sua postura de patrão. Inclusive quando ele, por casualidade, vê Maria nua tomando banho.
Jean-Luis conhece o "mundo" das empregadas
No entanto, começa uma amizade profunda e frágil entre Jean-Luis, Maria e as empregadas espanholas. Um dia, a pedido de Suzanne, ele ajuda Maria a levar alguns objetos para que sejam guardados no sexto andar. Aí ele descobre um mundo que ele nunca tinha visto, seja por falta de interesse ou, simplesmente, porque nunca soube que esse mundo existia. Começa a se interessar pelos problemas das empregadas e as ajuda com coisas simples, mas que nunca antes tinham acontecido. Manda concertar o banheiro entupido das empregadas, empresta o telefone para que Carmem possa saber como está a sua irmã que acaba ganhar um bebê e de quem não sabe nada há algum tempo.

O início da amizade
No entanto esta amizade é frágil, pois eles vivem em “mundos distintos” e Jean-Luis tenta manter o equilíbrio necessário; porém, há uma mudança no comportamento dele. Agora ele é mais alegre, se solta mais e parece que finalmente encontrou algo que nunca tinha encontrado: uma família com quem compartilhar as coisas mais simples da vida.
Jean-Luis vai morirar no 6º andar
O amor de Jean-Luis por María está controlado e não prejudica em nada seu relacionamento com a sua esposa. Mas Suzanne descobre que seu marido tem uma nova cliente, uma mulher chamada Bettina, dona de uma má fama em relação aos homens e acha que pode haver um caso entre eles e expulsa Jean-Luis do apartamento quando ele chega tarde uma noite. Apesar de ele lhe contar a verdade, que esteve na festa organizada por Pilar, uma das empregadas espanholas que conseguiu um apartamento graças a ele, Suzanne não acredita e acha que seu marido esteve com Bettina.
A amizade é frágil
Expulso de seu próprio apartamento, Jean-Luis encontra refúgio no quarto número três do sexto andar, e aquilo que em um primeiro momento pareceria “refúgio” se transforma na descoberta de um novo mundo: um universo onde ele não tem nenhuma das comodidades à quais estava acostumado mas que lhe oferece seu primeiro quarto “livre de verdade”; desse jeito, “livre” faz uma relação profunda com as espanholas e, quando seus filhos, algum tempo depois, sobem ao sexto andar para pedir que ele volte, ele diz que não porque encontrou pela  primeira vez uma família”.Mas elas são empregadas” reclama um dos filhos. “Não são empregadas. São mulheres maravilhosas e espero que vocês encontrem alguém como elas para amar”.

Cenas marcantes.

No lugar de continuar contando a história, vamos mencionar algumas das cenas mais marcantes deste filme.

A primeira é a chegada de María a Paris. A câmera se transforma nos olhos dela que miram extasiados as fachadas da cidade, admirando-as. É a alegria de quem chega pela primeira vez a uma grande cidade e descobre a beleza que só se encontra nas histórias dos outros ou, naquela época, nas fotos.

A solidariedade das mulheres do 6º andar
A segunda cena marcante mostra o conceito de solidariedade das mulheres do sexto andar é o primeiro dia de trabalho na casa de Joubert. O apartamento está totalmente bagunçado porque faz dias que ninguém o limpa depois da partida de Germaine. Então, ela pede ajuda, pela janela e a gritos, a sua tia Concepción, que deixa de fazer suas tarefas e corre para ajudá-la, mas antes chama também Carmen, Dolores e Teresa. Assim, as cinco mulheres limpam o apartamento. A cena e rápida, dinâmica e muito alegre. As mulheres trabalham felizes enquanto escutamos a versão francesa de uma canção da época: Biquíni de bolinhas amarelinhas.

Porém, uma das cenas realmente maravilhosas do filme é quando Jean-Luis cumprimenta María em espanhol e ela lhe corrige a pronúncia. Como Jean-Luis não consegue pronunciar o som correspondente à letra “j” espanhola, María, com entusiasmo e sem malícia, coloca a sua mão no pescoço de Jean-Luis e a mão dele, no pescoço dela, para que ele possa sentir como se faz esse som. O toque das mãos é mais que um simples toque para Jean-Luis: em um encontro com o corpo de María. A simplicidade do gesto de María é como se fosse um “ato sexual” muito mais profundo e íntimo que qualquer “ato sexual” comum.

Como falamos no começo, As mulheres do sexto andar é um filme de amor. Um amor que vai além do amor passional. É o encontro do amor da mulher e do homem, da mulher e seu filho, das amigas e seus sonhos, do amor com a própria vida e, principalmente, do amor pessoal.

O filme é narrado de forma cronológica e não apresenta nenhuma novidade na sua técnica narrativa. A narração é rápida, os diálogos são precisos e vale destacar também a belíssima música de Jorge Arriagada: uma trilha sonora alegre e doce, com certo toque de ar nostálgico e sonhador ao mesmo tempo, além de parecer misturar certos ritmos alegres franceses com ritmos alegres espanhóis.

Sem nenhuma dúvida, As mulheres do sexto andar é um filme pequeno com uma visão grande que vale a pena ver e desfrutar de cada uma dessas mulheres e as suas histórias.

Texto original de Patricio Miguel Trujillo Ortega.

Está proibida sua reprodução em qualquer médio sem a autorização escrita do autor.

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